
A arte de escrever
Com mais de 1 milhão de livros vendidos, ela é também um sucesso na internet: páginas criadas pelos fãs com milhares de seguidores no Facebook, perfis com suas frases no Twitter e diversos trechos compartilhados diariamente nas redes. Mas Martha Medeiros gosta mesmo é dos pequenos prazeres "offlines" da vida. “Um dia de sol, um convite inesperado, começar a ler um livro incrível” estão entre as suas preferências e são as inspirações para as suas obras, que falam sobre o cotidiano, relacionamentos e situações inesperadas.
A autora gaúcha formou-se em Comunicação em 1982 e trabalhou com publicidade e propaganda durante vários anos, quando, no Chile, passou a escrever poesias e, logo em seguida, teve suas primeiras crônicas publicadas em jornais.
Ela é a atração da segunda edição do ano do projeto Sesc Literatura do ano, que acontece na próxima quarta-feira (21), no Teatro Pró-Música. Super atenciosa, Martha bateu um papo com o Zine Cultural sobre literatura e carreira.


Quais são as “Coisas da vida” que te deixam “Feliz por nada”?
Conseguir cumprir as coisas que combino comigo mesma (cortar as pontas do cabelo, marcar hora numa massagista, ter a primeira aula de beach tênis, etc), receber um elogio por algum texto, um dia de sol, um convite inesperado, começar a ler um livro incrível, sete horas de sono seguidas (oito é um luxo que desconheço), descobrir uma nova música e baixá-la no meu Ipod... tudo isso e muito mais.

Quando você percebeu que escrever seria a sua paixão e profissão?
A paixão foi descoberta ainda menina, mas não tinha ideia que seria realizada. Não houve um dia exato em que virou uma profissão. Começou a virar em julho de 1994, mas ainda de forma experimental. Só me dei conta de que realmente essa história de virar colunista de jornal tinha dado certo quando lancei meu livro “Trem-Bala”, em 1999. Ali eu vi que seria um caminho sem volta.


Que tipo de leitura você faz nas horas vagas e qual o seu livro preferido?
Leio de tudo, mas prefiro biografias, livros com um viés psicanalítico e romances variados: adoraria ser uma romancista de mão cheia. Não sou nem serei, mas morrerei tentando. Poesia e contos, leio pouco. Não tenho um livro preferido, mas adoro todos os do Philip Roth e do Paul Auster. Quando pedem para eu citar só um, cito o “Ensaio sobre a cegueira”, do Saramago, que me impactou demais.

Você já disse que a reprodução indiscriminada dos seus textos na internet e o assédio dos leitores em alguns casos a incomoda. Como você procura lidar com isso e que diria àquelas pessoas que não conseguem enxergar esse limite entre seus textos e a pessoa Martha?
O assédio quase sempre é respeitoso, principalmente quando encontro as pessoas na rua: disso não reclamo, não. São afetivos, então fico muito gratificada. Só não gosto muito quando me escrevem e-mails com uma intimidade que inexiste, pedindo conselhos pessoais e ou especulando sobre minha vida privada. Mas não sou nenhuma celebridade e isso acontece pouco. O que realmente me deixa passada é a proliferação de textos mutilados, editados, adulterados, ou com autoria trocada (dizem que é meu o que não é, ou dizem que é de outro escritor o que é meu). É uma praga insolúvel. Só resta confiar no discernimento do leitor.


Nesses mais de 28 anos como escritora, o que mudou no perfil dos seus leitores? Você percebe uma mudança drástica no jeito de ler, em função das novas tecnologias?
Os leitores em geral (não só os meus) estão mais dinâmicos, querendo ler textos menores e com mais conteúdo, fazendo valer o tempo deles. Ninguém tem mais tempo sobrando, então a literatura acaba sofrendo as consequências desse imediatismo. Não acho que os escritores devam se adaptar forçosamente a isso. Eu, por natureza, sempre fui objetiva e escrevo com o fôlego curto, sou rápida nas minhas criações, o que me favorece diante desse cenário atual, mas não se deve mudar de estilo por causa de uma tendência. Mesmo que a tecnologia conspire contra, quem tem uma longa história para contar, que se estenda até onde sua inspiração exigir. Quem verdadeiramente gosta de ler (eu gosto) não se intimida com um número grande de páginas.

E qual o conselho você daria a jovens escritores?
Tenham humildade. Estrear na literatura não é o mesmo que estrear na “Malhação”, o sucesso não vem fácil. É preciso conquistar o leitor fazendo um trabalho honesto e persistente. É um longo caminho até a solidez da profissão – que às vezes nunca vêm. Não basta apenas escrever: qualquer pessoa alfabetizada sabe juntar palavras, o que não as torna escritoras. É preciso ter o dom do encantamento, ter domínio sobre a construção de um texto, é um trabalho de arquitetura e arte. Requer muita dedicação e muita leitura. Quem quer ser escritor, tem que praticar exaustivamente dessas duas formas: lendo diariamente e escrevendo dia após dia, não importa onde, não importa para quem. É que nem malhar, só que o órgão exercitado é o cérebro.
Convite feito, quem quiser exercitar o cérebro, é só passar na bilheteria do Teatro, na próxima quarta-feira, a partir das 16h, e retirar seu ingresso gratuitamente.